Coincidências do destino: amizade com Marcos Pontes

É lugar comum dizer-se que a vida vem sem manual de instruções. A história que eu vou contar mostra que na vida existem infinitas conexões em eventos aparentemente sem conexões. No fundo, conto a história porque é importante seguir seu coração, essa energia luminosa contida dentro de cada um de nós.

Desde sempre decidi que queria ser astronauta.  Astronauta para mim era a profissão do futuro, da liberdade, do conhecimento sem limites. Uma infância regada a StarWars e StarTrek colaboraram bastante, mas conforme eu crescia, o sonho permanecia o mesmo.  Sabia que isto não seria fácil, eu não era americano e nem russo, apenas 500 pessoas tinham conseguido o mérito da profissão nos últimos 50 anos, mas persistir nunca tinha sido problema pra mim. Deveria ingressar na academia da Força Aérea, seguir uma carreira militar brilhante, ser piloto de caça, me formar em Engenharia para depois tentar ser astronauta através de um concurso público.

Mas não foi bem assim que as coisas aconteceram na minha vida. Meu pai tinha um pequeno negócio, e dele dependia toda minha família. Eu era o único filho homem e pesava uma responsabilidade importante sobre minhas costas. Em determinado momento de minha vida, precisei escolher entre ajudar minha família ou buscar um sonho que parecia distante demais da realidade, e eu escolhi o que me parecia ser o correto: abandonar uma ideia egoísta e utópica e me dedicar para que o negócio que tínhamos prosperasse. E assim aconteceu…

Eu cuidava do marketing e das vendas, a empresa cresceu e eu permaneci satisfeito na minha rotina, até que um dia…em 2006 um astronauta brasileiro subia aos céus rumo ao espaço. Seu nome era Marcos, igual ao meu! E naquele instante, percebi o valor dos sonhos…

Eu podia ter estado naquele lugar, realizando a viagem da minha vida, representando a nossa pátria e os corações de milhares de brasileiros. Pensei: “Como pude ser tão displicente em não acreditar no meu sonho?” Em minha história de vida, sempre acreditei que quem persevera, alcança. Se as coisas ainda não estavam bem resolvidas, é porque eu não tinha feito o suficiente. Tudo ficou claro pra mim desde então. Sonhos servem para serem vividos! O fato de eu ter desviado de rumo não me dispensava de agir com o coração, requisito para uma vida plena e feliz.

Mas havia muito a se fazer. Eu já estava com 33 anos e naquela altura, parecia ainda mais difícil recuperar o tempo. O mérito daquele rapaz que estava descobrindo o espaço, fazia sentido porque ele havia feito a coisa certa, dedicou-se e correu atrás, foi persistente e conseguiu. Enquanto eu, dormi no ponto. Apesar das chances de um novo astronauta ser escalado serem curtas, eu tinha que buscar corrigir o curso de minha vida, acreditar e permanecer firme em meu propósito.

Passei a me inscrever em cursos na NASA, realizar visitas constantes aos centros de treinamento de astronautas, conhecendo os laboratórios das sondas espaciais até os locais onde os foguetes são construídos e lançados.  Cada momento me trazia mais próximo do meu sonho, mas naquela altura eu era apenas mais um nerd, um hobista feliz.

Um dia em 2007 li sobre uma empresa que estava iniciando a construção de uma nave espacial para civis, pessoas comuns como eu poderiam ter a chance de visitar o espaço finalmente. Era uma excelente notícia pra mim. A empresa chamava-se Virgin Galactic e prometia o voo por 200mil dólares, muito dinheiro!

Percebi que com meus rendimentos, demoraria uma eternidade para juntar estes recursos. Decidi que deveria traçar aquilo como uma meta de vida, poupar muito, trabalhar mais…e abri meu próprio negócio, de forma que eu poderia continuar prestando serviços a empresa que tínhamos também. No fim, era como seu eu tivesse 2 empregos. Virei representante do Google, e assim como montava projetos de alavancagem para meu negócio, ajudava a prosperar negócios dos meus amigos e clientes também. Adquiri conhecimento e aprendi muito. Consegui juntar um bom pé de meia, mas percebi que tanta dedicação com o trabalho, tinha seus efeitos colaterais. Precisei abrir mão de meus relacionamentos. E durante anos, foi um preço alto a se pagar!

Mas eu trabalhava como um camelo e ainda estava longe do meu sonho. A minha empresa, SejaVistonaWeb era uma agência de publicidade pequena voltada para o que eu fazia de melhor, ajudar as pessoas a vender! Me agrada muito este ambiente de sair e “fazer acontecer”, ampliar os horizontes e aprender com a experiência do outros. Mas faltava algo que juntasse o melhor do meu potêncial com o prazer do trabalho. Pensei na possibilidade de virar um representante da Virgin Galactic. Deste modo, encurtaria meu curso financeiro para minha viagem espacial, já que economizaria na comissão da compra e ao mesmo tempo os ganhos com as vendas seriam mais um contribuinte no meu “pé de meia”. Eu estaria fazendo o que eu mais amo, trabalhando como um vendedor de viagens espaciais e a demanda não seria tão grande. Sim! Eu poderia dar conta de mais este negócio também.

Então, abri mais uma empresa, desta vez na área de turismo.  Como na minha busca pela viagem espacial eu havia realizado um voo na Estratosfera e achava isso incrível, criei a “Aventuras Incríveis” que oferecia voos nestes caças supersônicos que era algo que eu conhecia bem, embora o objetivo principal era mesmo ser representante dos voos espaciais. Minha primeira decepção foi que após abrir o negócio, montar um site super bacana com diversas viagens exclusivas, a Virgin Galactic recusou meu pedido, bem provavelmente porque minha empresa era ainda muito jovem. A alegação deles foi que já haviam sido firmadas 100 parcerias no mundo e este processo já havia sido consolidado. Percebi que minhas chances eram mínimas, mas eu decidi que não pararia por aí…

Bom, primeiro eu permaneci com a Aventuras Incríveis aberta. Era uma questão de fé. De fato, a Aventuras Incríveis era uma empresa com um portfólio fantástico e inovador, isso exigia um alto custo para a divulgação e promoção. A coisa estava travada: empregar altas somas no negócio e correr o risco de perder tudo que eu havia juntado, ou investir mais e seguir em frente para que o negócio vingasse? Abrir uma empresa definitivamente não é algo simples, nem tão pouco fácil…e agora eu tinha 3 empresas para cuidar!

Algo precisava ser feito e em um dado momento, soube de um brasileiro que tinha voado em um caça na Rússia, assim como eu, e queria conhecê-lo de perto. Seu nome era Samuel Celegatti e ele tinha voado um Mig-25. Ele me disse que tinha ganhado a viagem em um concurso que havia sido organizado por uma rádio de São Paulo. O mentor era um tal de “Ota”. Vou chamá-lo assim por um bom motivo. Na verdade, eu só queria saber se o Ota topava entrar de sócio comigo na Aventuras Incríveis, afinal, eu precisava de ajuda. Quando conheci o Ota, ele me contou que tinha um site chamado OsIncríveis, o que era uma boa coincidência, e que também manjava tudo sobre o assunto. Então tudo parecia perfeito e combinei um encontro.

Assim que nos conhecemos, tive uma sensação negativa. Eu fui o mais gentil possível com ele, mas eu tinha a nítida impressão que o negócio não tomaria um bom rumo. Ele não tinha o perfil que me agradava e eu não poderia selar nada sério com aquele rapaz. Para evitar qualquer indelicadeza, expliquei a ele por telefone que tinha outros planos. Foi aí que percebi que meu instinto estava bem apurado. Sua reação com minha desistência na parceria não foi nada boa e ele ameaçou abrir um processo contra mim. Apesar do meu negócio já aberto e legalizado, com site no ar e propaganda de vento em poupa, na visão daquele rapaz, eu o havia chamado para se aproveitar do seu conhecimento e também do nome do site dele, para meu espanto! Ele me intimava alegando que eu estava usando o nome Aventuras Incríveis em alusão ao maravilhoso trabalho dele no site OsIncríveis. Ora, não bastou eu explicar a ele que o nome de minha agência estava devidamente registrada no INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial, para uso na internet e prestação de serviços comerciais de turismo. Ele não compreendia o valor legal disso. Ele não tinha nada além de um blog desatualizado com fotos da promoção de uma rádio, não tinha empresa de turismo aberta e muito menos autorização para operar pela Embratur. Como pode com um simples encontro a pessoa achar que tudo que você tinha, foi graças a ela? É curioso perceber como as pessoas tem certeza absoluta de coisas que não fazem a menor ideia.

E enquanto os progressos não aconteciam como eu esperava, em Julho de 2011 soube que a NASA faria seu último voo tripulado da década, aposentando os famosos SpaceShuttles americanos (Ônibus Espaciais), no caso, a Atlântis. Eu nunca havia visto a decolagem de uma nave espacial, e as notícias sinalizavam que era uma oportunidade única. Estes voos só aconteceriam com os russos, em uma base no Cazaquistão onde o visto para brasileiros era dificílimo! Eu precisava ver isso, não haviam informações seguras de como ficaria o futuro da NASA depois dos acidentes nos 2 Shutles e do alto custo do programa. Fiquei de prontidão no site da NASA para comprar um dos 2mil ingressos que seriam disponibilizados para ver de perto este último voo, mas tão logo abriu a venda na internet, preenchi o formulário e recebi uma mensagem de sold out! Ou seja, tudo foi vendido em um piscar de olhos!

Fiquei muito triste com a situação e foi muito difícil aceitar que nem mesmo uma espaçonave partindo eu veria com meus próprios olhos. Não bastava eu não ser astronauta, também não veria a última decolagem?

Então, tive uma ideia: haviam cursos na NASA disponíveis 2 dias antes da decolagem do Atlantis, eu me matriculei no curso e passei a acreditar que haveria uma chance. Comprei minha passagem pra poder assistir este momento de perto, mesmo sem nenhuma garantia que conseguiria, sabia apenas que tinha uma chama em meu coração que me conduzia para este local.

No Aeroporto de Guarulhos, lembrei daquele astronauta brasileiro, pois ele tinha acabado de lançar um livro. Foi ele que abriu meus olhos e recuperou meu sonho. Seu livro trazia o título “É Possível”, tudo que eu precisava naquele momento com tantas coisas dando errado. Procurei nas livrarias do aeroporto e não havia o livro a venda. Eu queria muito ler o livro, também seria uma fonte de inspiração para minha viagem tão cheia de incertezas.

Mas, como algumas coisas não acontecem por acaso, quando sento no avião, a primeira surpresa: ninguém menos que o próprio astronauta sentado bem ali ao meu lado! Aquilo não era somente um bom presságio, mas voltei a sentir-me criança dentro dos meus sonhos e naquela altura poder conhecê-lo pessoalmente, daquela forma, era uma coincidência incrível! E o primeiro contato aconteceu com muito entusiasmo, conversamos muito! Marcos Pontes foi a pessoa mais carismática que jamais conheci. Uma pessoa inteligente, acessível, simples. Ele conversava comigo e mantinha-se sempre sorrindo, simpático. Eu o encarava como a um irmão mais novo e pude reparar seu brilho nos olhos, voz serena e suave. A empatia foi imediata!

Contei a ele de meu sonho em chegar ao espaço e ser um astronauta, e que havia ainda uma chance pra mim através dos voos privados. Mencionei que tinha aberto uma empresa de turismo pensando nisso, mas que o negócio não desengrenava, porque não conseguia a autorização da Virgin Galactic. Notando seu interesse no assunto, propus que com ele no negócio, certamente tudo seria diferente. Ele, afinal, era a propaganda. Isso economizaria muito dinheiro na divulgação, sem contar que o negócio tem tudo haver com o DNA de um astronauta. Ele ficou bem animado com a ideia de uma parceria, mas disse que precisava de tempo pra pensar e avaliar. Nada mais natural, afinal, ele havia acabado de me conhecer. Sua primeira pergunta foi: “Você acha que há mercado para isso?” E eu apontei pra mim mesmo e falei: “Eu fui até a estratosfera e usei todas minhas economias da época para a realização deste sonho. Assim como diz no título do seu livro: é possível!” Nada melhor que ter usado este argumento. Ele abriu um sorriso confiante e guardou meu cartão.

Aproveitei e perguntei se ele estava a caminho da NASA para assistir ao último lançamento, quem sabe ele teria alguma forma de conseguir uma entrada pra mim… Mas ele me informou que iria descer em Houston, onde residia. De qualquer forma, percebi no fundinho que meus desejos começavam a tomar vida.

Cheguei no Kennedy Space Center na NASA e realizei meu curso “experiências de astronauta”. Passei pela atividade do giroscópio, aquele aparelho que gira você em todas as direções por vários minutos e cujo objetivo é simular uma cápsula desgovernada no espaço, dentre outras  fisiologias de voo. É comum que as pessoas fiquem enjoadas e não senti problema algum. Existem diversos simuladores bacanas neste curso. Durante o curso, um dos estudantes, um sueco, resolveu falar sobre a emoção de ser uma das 2mil pessoas no mundo que havia conseguido o ingresso para o último lançamento da Shuttle. Ao meu ver, o sujeito agia como um exibicionista crônico, tanta exibição no meio de pessoas ávidas pela mesma oportunidade deixava todo mundo chupando o dedo. Ele passava o ingresso nas maças de rosto das pessoas e ria, ao passo que algumas reagiam a brincadeira sem graça. Pensei: “como pessoas deste tipo são brindadas com estas maravilhas?”

Achei que poderia ficar por lá e assistir a decolagem do foguete espacial, mas sem o ingresso era impossível. Uma equipe de seguranças entrou na sala pra iniciar o processo de isolamento.  Nos colocaram em “fila indiana” na certeza que ninguém sobraria. Em um dado momento, informei que precisava ir ao banheiro, mas o segurança irredutível e com voz autoritária me chamou pra manter-me na fila de saída. Ou seja, eu deveria sair de lá e assistir da praia, como qualquer pessoa comum, a uma distância considerável e que tornava o foguete apenas uma pequena faísca cruzando o céu.  Sorte daquele sueco.

Descontente e embora do lado de fora do complexo, ainda era melhor ficar por lá, que nada. Resolvi dormir no estacionamento da NASA, dentro do carro que aluguei. Uma vez que eu atravessasse com meu carro pelo portão de saída, não haveria volta. Na pior das hipóteses, ficando por alí eu não estaria longe do lançamento. O esquema era deitar o banco do carro e relaxar…mas os dias não prometiam conforto.

Começou a anoitecer. O calor era intenso. Lembrando que Cabo Canaveral está situado na linha dos trópicos, a temperatura chegava facilmente aos 40 graus de dia e permanecia uns 30 a noite. Sem um bom ar condicionado, seu corpo começa a suar. Ligar o ar, significava ligar o carro e eu não podia fazer isso. Fiquei até que o vidro do carro começou a embaçar e isto já estava “dando bandeira”.

Escutei vozes. Notei  os seguranças da NASA perfilarem uma  rígida vistoria, apontando suas lanternas carro a carro e o meu logo seria um deles.  Notei que para o evento, só eram permitidos carros que portassem um crachá especial, coisa que o meu carro não tinha. Isso me pegou de surpresa. Precisava de tempo para pensar, então saí do carro sorrateiramente para me esconder no pântano. Isso mesmo, no pântano! A base de lançamento fica em uma região protegida e não há nada fora dos portões da NASA, nenhum banheiro, lanchonete ou lugar pra descansar, só havia mato, mosquitos e jacarés. Ah, também haviam formigueiros, talvez meu maior lamento foi pisar em um deles durante a noite. Sofri picadas de todos os tipos. Aquelas formigas tinham tamanho de baratas!

Percebi que não seria fácil dormir escondido em um local tão quente e úmido como aquele, virando comida de todo tipo de parasita que sentia o calor do meu corpo.  Suava em bicas. Fora todo o desconforto, naquela noite os olhos dos animais brilhavam apontados para mim, os murmúrios e gritos selvagens me fez sentir medo. A noite foi longa e não conseguia pensar, muito menos dormir.

Na manhã seguinte, tanto contato com o mundo selvagem e eu já me sentia o “homem das cavernas”. Murmurando, presenciei do pântano, desconsolado, meu carro sendo guinchado no páteo. Aquilo não estava nada bom…mas o pior era ficar sem comer e realizar atividades básicas de higiêne. As formigas me picavam o tempo todo e a situação estava crítica. A segurança intensificou as vistorias, passando detector de bombas embaixo dos carros! Será que eles acharam que meu carro era um carro bomba? A esta altura, poderiam estar levantando meu nome no FBI. Eu tinha que sair dali, mas não sabia como. As horas eram longas no pântano e a escuridão chegava rápido! Estava na hora de me proteger de novo de todos os agressores que me vigiavam.

No dia seguinte, quando já eram 4 horas da manhã, começaram a aparecer vários carros no estacionamento, eram os sortudos que iriam assistir a decolagem do foguete. Finalmente uma trégua! Eu pude ter uma pausa do pântano e me misturar a eles, pelo menos por um tempo.  Sem comer e nem beber, sem trocar de roupa, tomar banho e fazer a barba por mais de um dia naquele calor absurdo, minha aparência era deprimente. Eu estava sem dormir e no meu limite! As pessoas se abraçavam felizes com o momento  da decolagem histórica da espaçonave chegando, todos tranquilos em suas vidas e eu estava ali, todo abalado psicologicamente. Um carro estaciona bem do meu lado. De repente, uma pessoa sai,  põe a mão no meu ombro e diz: “eu conheço você!”

Me assustei na hora, mas vi que era um dos estudantes que participaram do curso que havia feito. Era o sueco e me perguntou: “você não disse que não tinha o ingresso? O que faz aqui?”- perguntou em voz autoritária. As pessoas olharam pra mim.

E eu, com aquela aparência de maltrapilho respondi timidamente: “Está tudo sob controle, vou dar um jeito de assistir esta decolagem”.  E o sueco disparou a rir, propondo sarcasticamente “é, acho que você vai ser a primeira pessoa no mundo a entrar na NASA sem permissão…” Bullying sueco. E enquanto o sujeito perfumado balançava seu tíquete feliz da vida dirigindo-se ao portão de entrada, eu permaneci por lá, parado, estático, quase sem conseguir pensar, tamanha a fome e o cansaço que me abalavam. O calor era intenso e me derrubava. O sueco havia me dado um banho de água gelada, tudo o que eu precisava naquela temperatura que me bagunçavam as ideias. Eu estava em um local sem autorização, quebrando regras em um país famoso pelo cumprimento de Leis rigorosas. Dei conta de que estava errado estar ali, e aquilo era sério!

Olhei para o portão pela última vez, sabia que se passasse por ali iriam fazer perguntas que eu não saberia responder, do tipo: “O que você está fazendo aqui sem autorização? Como entrou aqui?”

Eu sabia que toda a área estava isolada em um perímetro de 4 kilômetros e me restaria ver a decolagem de bem longe, mas isso se eu não fosse preso como possível terrorista primeiro!  Imagine a bronca que levaria de meus familiares? Dos danos diplomáticos que minha presença poderia causar por tamanha irresponsabilidade? E pra variar, o cérebro que já não pensava direito, porque minha bexiga estava quase estourando! Eu estava naquele combate mental, sem forças, sem energia.  Já estava quase na hora da decolagem do ônibus Espacial e eu decidi finalmente que havia bobeado, motivado pelo meu desejo desesperado de realizar um sonho, estava cometendo um grave equívoco. De fato, era muita infantilidade de minha parte. Deveria fazer o que era certo, me apresentar no portão de entrada, junto aos seguranças, solicitar se poderia visitar rapidamente o banheiro para me recompor e me retirar, seja lá qual fosse meu destino. Até me prender me poderia, mas só se fosse após a decolagem…desistir, jamais!

Me coloquei no final da fila de entrada do complexo, atrás do último felizardo que tinha o ingresso de visitação (afinal, se era pra eu dar algum vexame, que fosse na frente do menor número de pessoas possíveis). O ingresso era uma coisa magnífica, com leitor para código de barras e tudo, não tinha como uma pessoa atravessar aquele portão sem isso.

E o último da fila era um cadeirante, que trazia um punhado de livros no colo, sabe-se lá pra que. Na hora de passar pela catraca, se atrapalhou e derrubou seus livros ao chão. Pensei: “bom, pelo menos minha mãe me deu educação né” e passei a ajudá-lo recolhendo os livros um a um, quando uma sombra pairou sobre mim. Enquanto estava agachado no meio daquela bagunça catando livros, eram as pernas do segurança próximo ao meu nariz que me chamavam para olhar para o alto. Elevei meus olhos, mas o sol sombreava seu rosto. O segurança parecia um edifício! Em um momento câmara lenta, ele abriu a portinhola especial para cadeirantes, bem na minha frente, seguido de um “please, please…” gesticulando com as mãos…e o coração disparou! Era este o momento! Segurei firme na cadeira de rodas e empurrei aquele cadeirante pela passagem adentro, recebendo obrigado por todos os lados, do segurança ao cadeirante, e, quando me dei conta, havia entrado! Tudo numa fração de segundos!

E após carregar o cadeirante por alguns metros até que ele me dispensasse, novamente o peso na consciência me abraçou: olhei pra trás, portas fechadas…o segurança desapareceu. Foi aos 47 minutos do segundo tempo. Não há como negar, esse ingresso veio de cima! Agora tinham 2mil pessoas no Kennedy Space Center mais “um brasileiro que não desiste nunca”.

Na passagem pelo toallet onde tomei meu banho de pia, dei de cara com o sueco, que me olhou com cara de espanto e exclamou: “Você de novo? Como conseguiu?” E eu olhei pra baixo, depois pra cima, bati no ombro dele: “existem mais coisas entre o céu e a Terra que tu podes imaginar meu caro…”

Assim, assisti a decolagem do último voo tripulado do ônibus espacial americano de camarote, um momento sublime em minha vida, aquele terremoto emocionante e poderoso da engenharia humana rumo ao além, com direito a muitas lágrimas nos olhos. Hoje, sempre que as pessoas me questionam sobre a veracidade da visita do homem na Lua ou mesmo de sua chegada ao espaço, como testemunho deste momento, uma pessoa que sentiu a força do lançamento e as explosões dos motores, sempre digo ao questionante que ele deveria ver isso de perto. Sem dúvida foi um momento especial de minha vida. Também conheci diversas pessoas fabulosas naquele dia. Menos o sueco, é claro!

Tempos depois, já de volta ao Brasil, chegou na minha casa a multa do estacionamento: o mesmo valor do ingresso para a decolagem! Mais uma coincidência inexplicável. Ri da situação e paguei feliz a multa, livrando qualquer peso que restava em minha consciência.

Logo em seguida, uma secretária do Marcos Pontes me ligou perguntando se eu era o “cara que foi a estratosfera?” Respondi afirmativamente e ela completou informando que o Marcos Pontes gostaria de saber se poderíamos trabalhar no projeto dos voos privados ao espaço, assunto que havia proposto e discutido durante a viagem. Nada, definitivamente poderia dar tão certo!

Preparei a melhor apresentação da minha vida, um Planejamento de Negócio completo e com brilho nos olhos e entusiasmo, cumpri com meu papel. Ele adorou o projeto e combinamos de reinaugurar a Aventuras Incríveis em uma importante Feira de Esportes e Aventuras Radicais que aconteceria em breve em São Paulo.

E aí, apareceu de novo o Ota! Quando tudo parecia caminhar para o céu, vem alguém e me puxa para o solo. E o Ota estava a fim de vingança. Simplesmente o sujeito não largava do meu pé, e após saber pelas redes sociais de meu recente trunfo, não perdeu tempo para tentar me derrubar. Primeiro, mandou um email ao Marcos Pontes dizendo para ter cuidado, que eu era uma pessoa traiçoeira, que tinha roubado suas ideias e o nome da empresa dele. Fiquei em uma situação chata. No nosso site, ele preenchia o formulário de Interesse de Viagem usando nome fake e textos do tipo:

Nome: Pilantra

E-Mail: pilantragem@malandro.com

Viagem de Interesse: Vou pagar os caras pra nao te atender la fora seu corno “pilantra”.

E fazia isso o tempo todo com outras besteiras para me incomodar. Eu preferia me manter em silêncio. Ota infernizou tanto minha vida que isso acabou chamando a atenção do astronauta. Um pouco antes de nossa inauguração, Pontes me chamou no seu escritório. Pense bem, eu nem cheguei e já estava trazendo problemas. Uma pessoa como ele não precisava de mim. Eu podia esperar o pior, mas tinha a certeza que qualquer que fosse sua decisão sobre o assunto, minha consciência estava limpa. Ele disse: “preciso te mostrar uma coisa.” Pronto! – pensei. Lá vai…

Enquanto o astronauta lia na minha frente o email cheio de erros ortográficos e ideias desconexas com as mentiras do Ota, eu via toda minha conquista indo por água abaixo. No email, Ota dizia que eu era um fã do trabalho que ele desenvolveu, que eu era um oportunista atrás de holofotes e que havia copiado seu site. Então, Pontes parou e olhou pra mim. Com voz séria, disse: “Palhares, eu sei bem como é isso”. – Aguardei em silêncio e triste.

Pontes continuou: “Na minha vida, muitas pessoas tentaram me derrubar movidas pela inveja. Eu sofri muitas situações de perseguições e injustiças infundadas. Verifiquei o que você falou sobre o INPI e sobre sua empresa. Está tudo certo. Olhei o site dele e não há nada sobre vender viagens também. Esqueça-o. Vamos prosseguir!”

Aquilo pra mim foi o “Ufa” mais longo de minha vida! O Ota cometeu o mesmo erro dos adversários do Pontes, e ele capturou bem o que estava acontecendo comigo. Eu nunca poderia imaginar que a arma do meu inimigo se transformaria no meu maior escudo. Agora eu estava blindado e ainda mais próximo do meu novo amigo. Sempre existirão aqueles que brilham e aqueles que tentam apagar o seu brilho, e o Pontes sabia bem disso. Por isso precisamos trabalhar em silêncio, para deixar o sucesso fazer o barulho por nós. Pontes concluiu: “Uma maneira de se evitar as críticas, é não fazer nada, não dizer nada e não ser nada. Este tipo de coisa acontecerá mais vezes…” Aquilo me surpreendeu. Fiquei encantado com a confiança que ele depositou em mim.

Diante da imparcialidade do Pontes, Ota mandou refazer seu site, desta vez sim, copiando nossas ideias. Incluiu no site dele a nossa marca Aventuras Incríveis com um “R” de registrado, como se ele fosse legitimamente o dono da marca. Minha resiliência já estava no limite. Tínhamos tudo para vencer um processo, mas o sujeito não batia bem e essas coisas tomam muito do nosso tempo…De novo, ignoramos. Então, para minha surpresa, ele  mandou uma notificação judicial ao nosso escritório. Aquilo já era demais!

Ele estava disposto a brigar pela marca e eu também, embora o Pontes como pessoa pública não podia começar um negócio no meio desta confusão. Assim, graças ao Ota, tomamos a melhor e mais acertada decisão que poderíamos tomar para o nosso negócio: renomeamos a empresa! Ela deveria chamar-se Agência Marcos Pontes, consagrando assim a marca que mais faz jus aos nossos objetivos.  Redesenhamos tudo para a feira e inauguramos a empresa. Foi um sucesso, com direito a muita publicidade espontânea e tudo!

É claro que não havia mais justificativa para o Ota encher o saco. Ele deve ter acreditado que nos peitou e venceu, mas a verdadeira vitória foi toda nossa. O novo nome era perfeito e abriu-nos várias portas para as atividades de vendas e também no meio espacial! O próprio Marcos Pontes solicitou a autorização a Virgin Galactic e ficou muito mais fácil vindo pela empresa de um astronauta. A Virgin concedeu-nos a representação rapidamente. Veja só, quebramos o processo de uma multinacional do espaço e agora haviam 101 parceiros no mundo, incluindo a nossa Agência!

Veja como tudo que a princípio parece impossível, “é possível!” Poucas semanas atrás eram 2001 pessoas no Kennedy Space Center, quando só podiam 2mil. Acho que por isso gosto tanto do impossível, porque quem busca isso sabe que a concorrência é menor.

Claro, é ele afinal, Marcos Pontes quem representa o grande plano deste negócio. Montamos nossa agência de voos espaciais para turistas e minha vida nunca mais foi a mesma. Enquanto a Aventuras Incríveis não deslanchava, a Agência Marcos Pontes era o oposto. Hoje, a Agência Marcos Pontes, em homenagem a este pioneiro, amigo e sócio, oferece pacotes para voos de caça supersônicos na Rússia, treinamentos em gravidade zero, visita a modernas instalações científicas, passeios em submarinos e tanques de guerra. Fazemos e proporcionamos sonhos que são realizações de uma vida. Eu entro com a venda, ele com o treinamento operacional, juntos temos uma parceria de sucesso!

O mais legal é que estou sempre em contato com afixionados em aventuras extremas e não paro um segundo, não há mais rotinas em minha vida. Já realizei todo tipo de aventura, desde expedições em cavernas, lugares misteriosos, cidades perdidas, até viagens ao fundo do oceano! Estou escrevendo um livro sobre as situações mais iradas porque passei e vivi.

E o melhor aconteceu: agora, com mais esta empresa, consegui quitar minha viagem ao espaço! Serei astronauta, nem que por alguns minutos apenas, mas certo que este sonho não me escapa. Com isso, meu espírito teve paz e voltei a centrar-me nos relacionamentos que andavam em último plano na minha vida.

E tudo começou de uma viagem que eu poderia não ter feito. A vida é assim, feita de escolhas. Eu agradeço todos os dias o Universo pelos seus mistérios.  Agradecer, sempre eleva o espírito e trás felicidade, mesmo quando o momento não condiz com o agradecimento. Descobri que para o Universo conspirar a seu favor, você precisa abrir o espaço e permitir que a mágica aconteça. E independente do que aconteça a sua volta, faça o melhor papel que puder. A virtude não precisa de platéia, de aplauso ou de reconhecimento. A virtude é a sua própria recompensa.

Em minhas palestras eu busco levar as pessoas dentro destas aventuras, correr atrás, mergulhar fundo, voar alto! Motivo-as a quebrar barreiras e realizar seus sonhos. As coisas não caem do céu sozinhas. Mas havendo o empenho do cérebro, nervos e coração, pode-se chegar a vitória. Escute com carinho os aplausos. Saborear o sucesso gota a gota é magnífico, sem medo, sem culpa, é um momento de realização pessoal.  O caminho nunca será perfeito, nunca será fácil, mas quem disse que o final é mais gostoso se não for desta forma? Sem esquecer no entanto, que ninguém é bom demais, que ninguém é bom sozinho. Que devemos manter a humildade. Que se parecemos crianças as vezes, este é o mais puro comportamento do ser humano e de seu amor. Que devemos manter o sorriso no rosto e contagiar os outros a nossa volta. E que no fundo, por mais paradoxal que seja, muitas vezes as coisas caem mesmo é do céu, e é preciso agradecer.  Buscar estes momentos memoráveis transformam nossas vidas, que nunca mais serão as mesmas, é a nossa história sendo escrita! A vida é mesmo muito curta para ser pequena.

Eu espero que minha história possa inspirar as pessoas a seguirem seu coração. Ou melhor, eu acredito 110% nisso. Então, mãos a obra: faça acontecer!

Aproveite e lembrem sempre deste meu refrão:

“O céu não é o limite!”

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Comentários
  • Guiomar D.Pedrozo
    Responder

    Seu texto me tocou muito! Gratidão!

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