Expedição Amazônica – uma aventura na selva

Minha expedição na Amazônia aconteceu em mais uma daquelas viagens que busco contato máximo e interatividade local, cercado por especialistas que tornam o passeio ainda mais rico e seguro. Isto pra mim é o que faz a verdadeira diferença, me coloca em posição de aluno rodeado de grandes mestres e o aprendizado só pode ter um resultado feliz.

Pra mim, como que para qualquer morador das grandes cidades, essa mistura pragmática de poder ir para o meio do nada me fascinava. Mas “nada” é tudo, quando se chega lá e vê.

A selva amazônica começa da janela do avião e mesmo a 900km/h a vista pode permanecer por lá até 4 horas, composta de árvores e mais árvores, coisa interminável. Meu avião desceu em Manaus, e para meu espanto, ao atravessar a porta do aeroporto fui recebido por um bafo quente, uma verdadeira porta de fornalha que se abriu sobre minha face. Não imaginava, mas  foi exatamente esta a sensação  que eu senti ao sair de lá. Como pode?

Estava pela primeira vez passeando pela linha do equador, a área mais quente do planeta. No caso de Manaus, o calor aliado a umidade da gigantesca floresta, aumentava ainda mais esta sensação desconfortável, o que explicava bem o porque do ritmo das pessoas naquele pedaço de mundo, coisa que o “gringo da cidade” às vezes não sabe.

Juntamos o grupo e saímos em um trajeto em direção ao porto, de onde embarcamos nos navios gaiola, muito típicos aqui nesta região. Eu diria que estes barcos comparam-se  as frotas de ônibus em São Paulo, já que muitos trabalhadores os usam diariamente como forma de transporte. Eles tem geralmente 2 andares, sendo o segundo andar totalmente desamparado de cobertura, e assim aberto ao céu para o desgraçado que opta em conhecer o sol agressivo daquelas bandas. Foi uma viagem de 3 dias pelas águas barrentas do rio Amazonas, o maior do mundo que se diga. Nas margens, praticamente não há praia, são troncos e árvores contorcidas disputando a água da chuva, que quando ela vem, é realmente uma benção. Vale colocar que mesmo nestas regiões de sol a pino, a chuva é presente quase que diariamente, ela chega com a mesma brutalidade do calor, só que na forma de dilúvio, e cessa com a mesma surpresa com que aparece. Não há muito o que se fazer em um barco lotado de pessoas, cada um com sua rede, deitado e disputando um pouco do espaço do outro. O trajeto de 3 dias pode ser incomodo para quem não está acostumado, principalmente no terceiro dia que parecia não terminar nunca: nos primeiros dias você ainda fica atento as margens, procurando uma onça pra posar para uma foto, coisa que não aconteceu, até que a paisagem sempre verde regada ao barulhinho de tchu tchu tchu do barco durante todo esse tempo se torna deprimente.

Resolvi pular no rio e tomar meu primeiro banho daqueles dias, é assim que todos fazem aqui. Na minha vez, é claro, uma cobra cipó resolveu passar nadando ao meu lado. Só não retornei completamente nu ao barco porque tinha acabado de me ejetar.

Quando finalmente chegamos à margem do rio onde desceríamos ao nosso acampamento, avistei uma prainha e fui o primeiro a saltar do barco…apenas ouvi do guia aquele “nãaaaaaaaoooooo” em câmera lenta, quando se tenta evitar uma tragédia. Resultado: meu corpo atolou até a barriga na lama, em uma cena hilária. Precisei de 2 pessoas pra me puxar de cima do barco, cada uma segurando um braço meu, e perdi minhas botas presas no fundo da lama, mas por sorte não foram minhas calças.

Já que eu tinha sido o primeiro batizado da turma, ninguém precisou cometer a mesma bobagem de pular na lama, e deste modo o guia improvisou uma tábua para que todos usassem este caminho que flutuou por apenas alguns minutos. Em pouco tempo qualquer um podia perceber que a natureza mandava em tudo, ou seja, a cada passo uma surpresa.

Finalmente, sair da prainha e adentrar a selva foi realmente impactante em todos os sentidos. Eu nunca havia visto o dia virar noite, e foi exatamente isso que aconteceu. Aquelas árvores imensas tinham seus topos a perder de vista, num emaranhado difícil de descrever. Não se via mais o céu, e deste modo não se via mais a luz. E a escuridão na selva chega a ser assustadora na primeira impressão, aja vista a quantidade de sons e grunhidos de animais que você desconhece. São tantos sons e ao mesmo tempo, que não formam um coral, mas uma bateria imprecisa, fato que não se consegue saber o volume de espécies que te vigiam.

Seguimos pela mata e o guia abria caminho de facão. Eu que tinha perdido minhas botas passei a me preocupar com o risco de pisar em uma cobra, certamente haviam muitas e de todos os tipos.

Nosso destino era uma base militar, os CIGS, grupo de elite do exército brasileiro. Uma  caminhada curta na selva facilmente se torna longa diante de tantos obstáculos, e o que deveria levar 30 minutos em linha reta levou 3 horas.

Ao avistar a clareira, chegamos na base. Na porta, guardada por 2 oficiais, cada um tinha uma onça. Explico: ao invés de um pastor alemão, a onça fazia a vez, e tinha uma parda e uma negra. Esta última eu pensei tratar-se de uma pantera, mas o oficial logo me corrigiu informando não existir panteras em nossa selva. Achei bem curioso isso, porque ela realmente parecia uma pantera negra.

Logo fomos alojados junto com a equipe, tomamos um café de noite e fomos dormir nos beliches. Um artrópode no entanto, resolveu bagunçar nossa noite. Ele era pequenino e passou por baixo da porta do quarto. Chegando mais perto, vimos tratar-se de um escorpião! Um dos nossos tinha um copo e cercou o animal peçonhento, carregando-o até o laboratório da estação para análise. Tratava-se de um ser extremamente letal, ou seja, seu tamanho discreto enganava bem: o Tityus serrulatus é comum por aqui e por ser um animal de hábitos noturnos, não é incomum que aplique diversas ferroadas  em um leve movimento na cama quando viramos pra dormir. O veneno dele age sobre o sistema nervoso periférico, causando dor, pontadas, aumentando a pulsação cardíaca e diminuindo a temperatura corporal. Pode matar em minutos se não houver antídoto. Contando isso, fica fácl imaginar que a noite foi longa, com direito a palitinho segurando os olhos bem abertos.

Na manhã seguinte fomos conhecer o trabalho destes militares, coisa de se tirar o chapéu. Eles eram treinados para proteger as fronteiras continentais de nosso país, em um local onde a maioria das pessoas nem sabe que existe. Quando se pensa em treinamento, aqui tinha-se a verdadeira  prática de jogos de guerra: a começar da logística difícil de suprimentos, o modelo de camuflagem real para as necessidades ideais de combate, as atividades de rapel, arvorismo, construção de jangada, exercícios de sobrevivência e mais estratégias.

Em um dado momento, me afastei do time principal e me deparei com uma gaiola de uns 2 metros de altura, onde dentro havia uma espécie de gavião empalhado. Saquei minha máquina fotográfica para registrar o monstro, quando de repente notei seus olhos que tinham o tamanho do meu rosto dar uma rápida piscada. Olhei para os lados e não havia ninguém próximo. Saquei a reparar seus olhos com mais atenção, e tomei um susto! A criatura realmente estava viva, uma ave de rapina com quase 2 metros de altura!

Diante de tão incrível animal resolvi buscar algum conhecido que comprovasse minha história. Ao chegar diante da gaiola, o rapaz da minha turma exclamou “é claro que isso não é de verdade” e mau ele terminou sua frase e a ave resolveu mexer uma de suas asas, que pela envergadura, não podiam ser totalmente abertas naquele espremido espaço. O susto que ele tomou e o olhar atônito que eu ainda mantinha, era de se esperar que alguém esclarecido aparecesse para explicar o que assistíamos: um oficial que chegou perto de nós e com palavras mais que tranquilas, como se fosse a coisa mais normal do mundo, resumiu: “capturamos este gavião recentemente, um fazendeiro da região nos disse que ele estava roubando os filhotes do seu gado… ”

– Como assim? Retruquei – ele roubava comendo?

– Não! Logo que nascia o bezerro este animal agarrava com suas presas e sumia pelos ares.

Eu não duvidei. Mantive-me com minha cara de espanto, ao presenciar aquela ave com suas dimensões incríveis, perguntando-me onde estava a reportagem pra mostrar isso ao mundo.

Já estava na hora de voltarmos ao nosso barco, e no caminho pela selva, notamos pegadas de onças. Elas haviam farejado nosso rastro e seu instinto de caça apurado não foi suficiente o bastante para nos pegar de surpresa, no entanto, restava o caminho da volta. Ficamos em alerta de que podíamos estar sendo seguidos. Nestes momentos a famosa frase “Lei da selva”,  teorias como a “sobrevivência do mais apto – Darwin” e outras mais vem a mente para levar-nos ao banho de realidade do que somos e representamos para o mundo: um dia, posso estar ganhando o prêmio Nobel em Estocolmo e no outro posso ser um pedaço de carne para um felino faminto.

Felizmente chegamos ao barco sem nenhuma desventura, mas como nem tudo pode ser perfeito, minha máquina fotográfica perdeu-se no fundo do rio amazonas em minha viagem de volta, junto com outros registros valiosos desta experiência.

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